Introdução
O Estado de Gaza, também conhecido como império de Gaza, abrangia no seu apogeu toda a área costeira entre os rios Zambeze e Maputo e tinha a sua capital em Manjacaze na actual província Moçambicana de Gaza.
Foi fundado por Sochangane, também conhecido por Manicusse (1821-1858) como resultado do M´fecane, um grande conflito despoletado entre os Zulu por consequência do assassinato de Chaca (ou Shaka) em 1828, que culminou com a invasão de grandes áreas da África Austral por exércitos Nguni. Entretanto, nesta dissertação visa abordar-se sobre o Estado de Gaza, onde no âmbito do deste, falar-se-á dos vários aspectos referentes a este.
Índice
Introdução. 1
O Estado de Gaza. 2
M’fecane e o Estado de Gaza. 2
As consequências do M’fecane foram vastas, conduzindo a alterações demográficas e Sociais: 3
Formação do Estado de Gaza. 4
A organização político-administrativa. 5
Base económica. 6
Estrutura social e aparato ideológico. 6
Decadência. 8
Conclusão. 9
Bibliografia. 10
O Estado de Gaza
Até ao século XIX, a região entre a baía de Maputo e o Sul do Zambeze nunca tinha sido berço de um grande Estado. Mas foi-o com a criação do Estado de Gaza. O Estado de Gaza foi criado por um povo que fugia ao movimento do M’fecane, os Nguni. Em três gerações, este Estado fortaleceu-se e foi mesmo considerado um dos maiores da África Austral.
M’fecane e o Estado de Gaza
O M’fecane é um período de lutas e de transformações políticas profundas que tiveram lugar na região da Zululâncjj no início do século XIX. Foi caracterizado por uma grande invasão em diversas direcções e sobretudo em direcção a Moçambique, como consequência de extenso movimento de migrações Nguni.
São vários os factores combinados que terão Contribuído para o M‘fecane:
- A região da Zululândia transformou-se numa zona de grandes pressões devido ao aumento populacional, nos finais do século XVIII, que conduziu à falta de terras para o cultivo e pastagem;
- O crescimento comercial na baía de Ma puto e o desenvolvi mento das ligações comerciais entre a baía e o Natal levava a constantes clivagens interlinhagens pelo controlo das rotas comerciais do litoral para o interior;
- O a crise ecológica (facto que provocou anos sucessivos de seca e fome) originou a crise agropecuária, o que levou a conflitos entre as linhagens pelo controlo de terras férteis para a agricultura e pastorícia.
As lutas constantes interlinhagens para controlo de recursos fez diminuir e enfraquecer algumas unidades políticas. Assim, na segunda metade do século XVIII, surgem os principais grupos que saíram fortalecidos da crise: os ngwane de Matiwane; os ndwandwe de Zwide; e os mthetwa de Dingiswayo.
Entre 1816 e 1821, eclodiu um conflito entre os dois reinos, resultando na captura e morte de Dingiswayo, rei dos Mthetwa. Din giswayo foi sucedido por Tchaka da linhagem Zulu, que na altura era o grande chefe militar.
A partir de 1818, Tchaka, conhecido como Tchaka Zulu, iniciou campanhas de conquista e submissão não só do reino de Nduandue como de outras linhagens da região da Zululândia. Esta campanha de terror e devastação obrigou à fuga de vários núcleos de resistência, como os Ngunis, que mais tarde formaram outros reinos, como o Estado de Gaza.
As consequências do M’fecane foram vastas, conduzindo a alterações demográficas e Sociais:
- Levou a que determinadas zonas ficassem quase desertas (Natal, por exemplo) e a que outras ficassem densamente povoadas;
- Conduziu a que diversos fragmentos étnicos ficassem juntos numa mesma nação (nação Basutho);
- Fez que o padrão da distribuição da População na África do Sul mudasse radicalmente;
- Eu também origem ao surgimento de grandes estados rigidamente organizados em linhas militares com uma grande concentração do poder nas mãos do rei a um grau nunca antes conhecido pelos sistemas políticos tradicionais, como o Estado de Gaza;
- Destruição de unidades políticas pequenas;
- Introdução de novas tácticas de guerra (regimentos de idade militar, amabuto)
- Introdução de um serviço militar prolongado, novas armas (principal mente a seta de cabo curto) e integração de membros de diferentes tribos numa única comunidade política;
- Desenvolveu-lhes o sentido de identidade e realidade comum e Contribuiu para o declínio de alguns estados como o Marave e Yão.
Orner Cooper, in Amélia Neves de Souto, Guia Bibliográfico, p. 28 (adaptado)
Formação do Estado de Gaza
Um dos núcleos em fuga que vai seguir em direcção a Moçambi que será Jiderado por Sochangana e fixasse primeiro em Lourenço Marques, entre 1822-1827. Depois, rumou mais para norte.
O nome GazaO Estado de Gaza deve o seu nome ao bisavô de Sochangana que se chamava Mangwa Gaza.
Muzila é velho dos seus 70 anos, magro de altura regular, feições agradáveis, barba bastante, que usa rapada, e physionomia sympatica.
Veste na cinta um pedaço de pano paló e sobre elle alguns pelles de macaco e ao pescoço um lençol azul e branco, amarrado por duas pontas; na mão esquerda uma charuteira de palha coberta de missanga; e na direita uma caixa de prata para rapé. Está débil, e quando anda apoia-se a um pau que lhe serve de bengala.
António Cardoso, in Gerhard J. Liesegang, Ngungunyane, p.14
Sochangana tinha-se afirmado, entre 1821-23, como líder de um grupo, junto com mais três ou quatro que conseguiram fundar novos esta dos depois da derrota do Estado Ndwandwe de Zwide. Foi este grupo que formou o Estado de Gaza e em 1850 já dominava a região entre o Zambeze e o rio Incomati. O rei Sochangana goverflou cerca de 38 anos.
O Estado de Gaza foi provavelmente fundado em 1821 na zona de Tembe, ao sul da actual cidade de Maputo. O Estado de Gaza teve um período de expansão e organização que durou de 1821 a 1841 ou 1845. Nessa última data já se estende do rio Incomáti, no Sul, até ao rio Zambeze, no Norte.
O fundador do império é o já mencionado Sochan gana ou Manukuza.Man ukuza era filho de Zikode e bisneto de Man gwa Gaza. O nome de Sochangana deu origem ao termo Chan gana, inicia/mente utilizado para designar os nacionais (geralmente os aculturados) de um Estado do Incomati ao Zambeze sem distinção da sua origem étnica. E depois, no tempo colonial, um grupo étnico evidenciando alguma ¡n fluência nguní, daí a aplicação do termo se ir reduzindo.
Até cerca de 1950-60, na Beira, toda a gente com oreihas furadas, que incluía os Ndaus e Teve, era ainda conhecida como changana.
Gerhard J. Liesegang, Ngungunyane, pp. 10-11
A guerra civil de 1859-1862 e, nos anos seguintes, as escaramuças no Sul abalaram o Estado a sul e a norte, mas este reorganizou-se, embora sem grande esplendor.
A partir de 1825-27 a capital do Sochangana estava situada na margem esquerda do rio Incomáti e mais tarde passou para a margem direita do Limpopo, na zona de Chiduachine, no limite entre os distritos de Chokwé e Chibuto.
Entre 1835 e 1838 a capital passou para a zona de Mossurize, que foi conquistada a um outro estado Nguni chefiado por Ngaba Mbane. Depois de 1838, o centro de Gaza passou de novo para o vale do Limpopo, na zona de Chaimite moderno, onde Sochangana ficou até ao período do seu sucessor Mawewe (1858-1861).
Muzila, depois de obter o poder em 1862, transferiu a capital para a zona dos cursos superiores do rio Buzi e Mossurize, ao norte do rio Save. No período de Ngungunhane, que assumiu o poder em 1884, a capital era Mandlakazi, no sul de Moçambique.
A Organização Político-Administrativa
O vasto território do Estado era administrado através de uma política de assimilação adoptada pelos Nguni, na qual os elementosda população dominada eram integrados em regimentos nguni e, mais tarde, passavam a servidores como funcionários no exército e na administração do território.
No topo da hierarquia estava o rei ou monarca que era designado por inkosi, com funções políticas, militares, jurídicas, económicas e religiosas. Este era auxiliado por um corpo de funcionários. O hosana, por exemplo, era responsável pela cobrança dos tributos, distribuição de terras, resolução de litígios, mobilização de regímen tos, etc.
O Império ou Estado de Gaza era subdividido em reinos, à frente dos quais estava o hosana, e o reino, por sua vez, subdividia-se em províncias chefiadas por um induna. Abaixo deste estava o chefe da povoação, o munumusana.
RELAÇÃO DOS CARGOS ADMINISTRATIVOS
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Cargo
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Circunscrição
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Inkosi
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Estado ou
império
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Hosana
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Reinos
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Induna
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Províncias
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Munumusana
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Chefe da
povoação
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A administração do território era feita através do sistema de casas, designação dada às áreas tributárias, que representava o modelo de divisão do Estado de Gaza.
Sistema de casas
Era uma forma usada pelo sistema administrativo do Estado para controlar a colecta de impostos através do número de casas em cada comunidade aldeã. Na altura as casas eram constituídas por pessoas das mesmas famílias e eram uma espécie de famílias alargadas.
Base Económica
- As fontes de rendimento do Estado de Gaza provinham de várias origens:
- Da agricultura desenvolvida em quase todo o Estado;
- De tributos pagos pela população em géneros, saques e pilhagens feitos durante as guerras (gado, cativos e outros bens, etc.);
- De alimentos dados à corte pelas chefias locais e pela população, ou tirados por emissários do rei, soldados e outros ele mentos ligados à classe dos governantes;
- De pagamentos feitos por estrangeiros para facilitar as transações comerciais;
- Da obtenção de licenças de caça, etc.
As populações do Estado de Gaza já conheciam a olaria, a cesta- ria, a talha em madeira e a metalurgia. A economia deste Estado era adaptada aos recursos existentes em cada zona.
Na sua maioria, os seus habitantes eram criadores de gado bovino, uma actividade extremamente importante para as aristocracias locais dominadas pelos Nguni. Outra actividade económica importante foi o comércio de marfim.
Diferentemente do Norte do país, no Estado de Gaza o comércio de escravos era uma actividade proibida. Há relatos de casos de comerciantes que, na tentativa de desenvolver esta actividade, foram presos e assassinados pelo rei Sochangana.
Estrutura Social e Aparato Ideológico
No Estado de Gaza, existia uma nítida divisão em classes sociais. Na estrutura social tínhamos os nguni puros, membros da linhagem real, seguidos dos mabulundlela (altos funcionários do Estado); depois os Ndau; seguiam-se os tonga; os cativos chamados tinhoinko (cabeças) e os membros das chefatu ras dominadas.
ESQUEMA DE ORGANIZAÇÃO
SOCIAL DO ESTADO DE GAZA
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Grupo Cultural
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Tsonga e Chopi
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Nguni
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Chona
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Estatuto
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Grupos dominados
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Grupo dominante
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Grupos dominados
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Estratificação Social
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- Chefes Tongas
- Mabulundlela (origem Tsonga e Chopi)
- Súbitos tsonga
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- Alta aristocracia
- Média aristocracia (assimilados)
- Ndau
Tinhoiko (cativos)
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Ndau chefes Tonga
- Subitos Tonga
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Fonte: Historia de Moçambique, vol. 1, p. 94
A acção do rei era limitada, para as grandes questões contava com a intervenção da rainha-mãe, dos conselheiros, da aristocracia dominante, dos governadores provinciais e dos comandantes militares. O rei simbolizava a unidade do Estado e a lealdade política.
Para além dos poderes civis, político e militar, ele era o representante religioso máximo do seu povo, cabendo-lhe a missão de dirigir as cerimónias mágico-religiosas.
A poligamia praticada pelos reis africanos era sem qualquer forma de dúvida um método extremamente eficaz de integração dos povos conquistados e de unir os diferentes elementos que constituíam uma determinada sociedade.
O Ubunkosi constituiu o padrão cultural do Estado de Gaza. Caracteriza-se por incluir algumas instituições de organização política interna (sistema de casa), uma posição especial para mãe do rei, certos rituais como nkwaya/nqwaya (hoje nkway, que corresponde ao incwala dos zulus e swati e que inclui primícias de nkanye). Por volta da lua nova do mês de Fevereiro, eram comum a prática de “medicinas de guerra” e a realização de festas onde se faziam louvores ao rei nos poemas em língua Nguni. Também eram celebradas as festas de monarquia e dos primeiros frutos, geral mente para indicar o início das colheitas.
Tem Muzilla muitas mulheres e o número de filhos é também avultado, mas os mais importantes são Modongaze/Modungazwe, Mafomane/Mafe mane e Como-Como! Nkomonkomo, que dizem ser quem ele deseja que lhe suceda, e por isso a ver se contentava os outros dois deu-lhes terra e gente.
Porém, Mafumane, dotado de péssimos instintos, guerreia constante mente Modo n gaze, a ponto deste o ter ameaçado com a intervenção dos brancos (portugueses).
Quem tem mais probabilidades de vencer é Modon gaze que, pela sua bondade, tem sabido conquistar a afeição da parte mais poderosa dos súbditos de seu pai.
António Cardoso, in Gerhard J. Liesegang, Ngungunyane, p. 14
Medicinas de guerraMedicina de guerra é o nome atribuído à cerimónia presidida pelo rei, com rituais nas aldeias dos antepas sados dos nguni reinantes (Nodwengu, Chidwachine, Chayimite).Também se designa esta cerimónia de “mbengululu” ou “mbenguyuyu”
Os problemas de sucessão foram sempre a base dos conflitos.
Em 1883, Muzila estava velho e quase não governava. Esta situação começava a preocupar a aristocracia pois Muzila tinha muitos filhos.
Em 1884, Muzila morre e, em 1885, Modongaze ou Mundungaze que passou a chamar-se Ngunguyane ou Ngungunhana assume o trono na altura da Conferência de Berlim.
Decadência do Estado de Gaza
O Estado de Gaza constituía uma ameaça ao plano colonial concebido pelos portugueses. O rei Gungunhana várias vezes desafiou o ocupante. Os portugueses tentaram estabelecer negociações com o rei de Gaza com vários objectivos:
- Impedir que o rei ganhasse forças no campo militar, prometendo que não atacariam o seu território;
- Evitar a sua aliança com a Companhia de Moçambique;
- Evitar o estabelecimento de relações com Bristh South African Company de Cecil Rhodes.
- Fazer surgir pela força o prestígio português nos pequenos regulados;
- Fazer alianças com os chefes submetidos ou amedrontá-los;
- Cercar Gaza e dominar Gungunhana.
As tropas de Gaza sofreram duas importantes derrotas, a de Marracuene e depois a de Coolela, mas continuaram a resistir sob o comando de Maguiguane Cossa.
Esta acção bélica enquadrava-se na política de António Enes, no âmbito das determinações da Conferência de Berlim de 1884-85.
Gungunhana foi preso pelo capitão Mouzinho de Alburquerque em 2 de Dezembro de 1895 e deportado para Lisboa e depois para os Açores, onde viria a morrer em 1906.
Conclusão
Terminado o trabalho, pôde concluir-se que o rei de Gaza dominou os reis Tonga através dos membros da sua linhagem, os Nguni, comerciando marfim, que recebia como tributo, com os portugueses, estabelecidos na costa
Constatou-se também que aparentemente, Sochangane não fazia comércio de escravos – os seus guerreiros eram principalmente da sua linhagem –, nem devolvia aos portugueses os escravos que fugiam para a sua guarda.
Com a sua morte, sucedeu-lhe o seu filho Mawewe que decidiu, em 1859, atacar os seus irmãos para ganhar mais poder. Apenas um irmão, Mzila (ou Muzila) conseguiu fugir para o Transvaal, onde organizou um exército para atacar o seu irmão. A guerra durou até 1864 e, entretanto, a capital do reino mudou-se do vale do rio Limpopo para Mossurize, a norte do rio Save, na actual província moçambicana de Manica.
Em Mossurize, em 1884, ascendeu ao trono Nguni, Gungunhana, filho de Muzila.
Bibliografia
- BICÁ, Firoza, MAHILENE, Ilídio, Saber História 10, 1ª edição, Longman Moçambique, Lda., Maputo, 2010
- NHAPULO, Telésfero de Jesus, História 12ª classe, Plural Editores, Maputo, 2013
- UEM, Departamento de História, 1983, História de Moçambique Volume 2: Agressão Imperialista (1886-1930). Cadernos
- www.escolademoz.blogspot.com

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